Fundada em novembro
de 1949, no Rio de Janeiro (RJ), a Companhia Autocarrocerias Cermava
teve importante participação ao longo das duas décadas seguintes no
mercado brasileiro de carrocerias de ônibus. Logo após sua criação a
empresa foi adquirida pela paulista Caio. (José Massa, fundador da Caio,
participou da primeira administração da Cermava como Diretor
Superintendente e, desde 1955, como Presidente.) Foi nas instalações da
Cermava que, em ousado lance de pioneirismo, a partir de 1953 a Caio
fabricaria chassis com motor traseiro sob licença da italiana Siccar.
Tal vinculação entre as duas empresas ocasionou, por vezes, certa
semelhança estética e estrutural entre seus produtos, especialmente no
início dos anos 60.
Como todas as encarroçadoras cariocas de
então, também a Cermava iniciou suas atividades produzindo lotações e
micro-ônibus sobre chassis importados. Já em 1955, porém, a empresa se
anunciava como produtora de “estruturas metálicas para todos os tipos de
ônibus“, inclusive “micro, papa-filas e troley-bus“. Em 1957 apresentou
uma versão rodoviária (“para ligações interestaduais e
intermunicipais“) sobre chassi FNM 9500 A, trazendo duas características
inéditas em nossos ônibus: as largas janelas laterais corrediças, que
mais tarde passariam a ser o padrão da indústria (os modelos urbanos
ainda utilizavam janelas de abaixar, tipo guilhotina) e o teto em dois
níveis, conceito que seria relançado com grande sucesso pela Nielson em
1961. Em 1960 a Cermava já se consolidara como fabricante de veículos de
qualidade, reconhecidamente sólidos e resistentes. Naquele ano
inaugurou novas instalações e modernizou sua linha, agregando às novas
carrocerias janelas duplas, de correr (inclinadas nos modelos
rodoviários), para-brisas dianteiros panorâmicos e faróis duplos. Poucos
anos depois, em 1965, ao decidir concentrar a atuação em São Paulo, a
Caio se desfez da participação na fábrica carioca.
Com a crescente sofisticação introduzida nos
ônibus rodoviários pela concorrência, a participação da Cermava no
segmento de longa distância, que nunca foi significativa, se reduziu
ainda mais. O modelo urbano, no entanto, teria vida longa, passando por
sucessivas atualizações estéticas ao longo da década de 60, sempre
mantendo a silhueta acentuadamente arredondada (porém bem proporcionada)
da marca, especialmente na traseira e na curvatura do teto. Em 1963
ganhou nova frente e para-brisas maiores e, logo a seguir, janelas
inclinadas em toda a linha e para-brisas dianteiros ainda mais altos e
com menor curvatura lateral. Em 1966 o bem resolvido desenho de sua
carroceria alcançou o melhor momento, graças à nova traseira com amplos
para-brisas e à peça de fibra-de-vidro envolvendo a grade e os faróis
duplos. Em 1968, um anti-clímax com o lançamento do modelo Frente Nova
(faróis retangulares e grade de barras horizontais delgadas, encimada
por uma larga tela de alumínio de baixa qualidade). Este modelo foi
retocado em 1970, quando teve aliviada a infeliz estilização anterior,
esforço auxiliado pelo retorno dos faróis duplos e pela substituição da
tela de alumínio expandido por barras horizontais.
Embora
apresentasse um produto de qualidade, a Cermava, empresa de pequeno
porte, não aproveitou o crescimento de mercado nos anos 60 para
modernizar suas instalações, processos industriais e veículos, vindo a
sofrer fortemente os efeitos da crise que quase destruiu o setor no
final da década. Para agravar o cenário, em meio a uma disputa de
herança pela morte do proprietário, em fins de 1968 a fábrica foi tomada
por um incêndio. A produção foi drasticamente reduzida: de 440 ônibus
em 1967 (417 urbanos, terceiro maior produtor do país, junto da
Eliziário), caiu para apenas 160 em 1970. Assim, em outubro daquele ano,
com a fabricação reduzida a menos de 20 carrocerias mensais, a empresa –
até recentemente líder de mercado no Rio de Janeiro – entrou em
concordata.
Na tentativa de ocupar sua mão-de-obra, que já fora
reduzida á metade, por encomenda da Construtora Camargo Corrêa fabricou,
ainda em 1970, um papa-filas para o transporte de trabalhadores no
canteiro de obras da hidrelétrica de Ilha Solteira. Montado sobre
semi-reboque Fruehauf e tracionado por um cavalo mecânico Mercedes-Benz
LP331, o conjunto, com 18 m de comprimento e capacidade para 238
passageiros, foi anunciado como o primeiro de uma série. Apesar de ter
sido também sugerida sua aplicação militar, para o transporte de tropas,
um único exemplar foi construído. Em 1971 a Cermava conseguiu ainda
alguma recuperação (229 carrocerias, das quais 190 urbanas), não
logrando, porém, acompanhar os índices do setor e continuando a perder
posições relativas (8º – e penúltimo – produtor nacional, com 5% do
mercado, contra 5º lugar em 1967, com 11%). Finalmente, no último
trimestre de 1971 a empresa decidiu encerrar a fabricação. Antes do
final do ano, no entanto, a Metropolitana adquiriu suas instalações e,
valendo-se do prestígio da marca Cermava, retomou a produção, que logo
alcançou 30 unidades mensais.
Novo modelo foi apresentado em
1972. Numa época em que a indústria de carrocerias embarcava na moda do
teto plano, a Metropolitana lançou mão de uma solução engenhosa para
modernizar, sem grandes investimentos, o estilo ultrapassado da Cermava:
no alto das janelas laterais instalou “bandeiras” de vidro curvo que,
ao mesmo tempo que aumentava a visão externa para os passageiros de pé,
não exigia alterações na estrutura do ônibus nem a enfraquecia, como
freqüentemente ocorria nas casas fabricantes tecnicamente menos
preparados. Disponível também para montagem sobre chassis e plataformas
com motor traseiro, este modelo foi batizado Copacabana.
A compra
da Cermava dotou a Metropolitana – que até então só fabricara
carrocerias de alumínio – de toda uma linha de produção de estruturas de
aço. Ao renovar seu modelo urbano em 1973 (ao qual deu o nome Ipanema),
a Metropolitana lançou-o em duas versões: com carroceria em aço
estampado ou em perfis de alumínio. A versão em aço foi chamada Cermava
Copacabana. Em 1975 a Caio adquiriu o controle da Metropolitana,
desativando a marca Cermava. Estima-se que, até sua transferência para a
Metropolitana, a empresa carioca tenha fabricado pouco mais de 6.000
unidades.